ADOTAR É AMAR
Adoção de crianças e jovens no Brasil
Esta site foi criado para a atividade avaliativa do IFMG disciplina português na semana da consciência negra.

Ainda existe preconceito na adoção no Brasil?
A adoção no Brasil passou a ser legalizada em 1916, com o Código Civil. De lá pra cá, muita coisa mudou. Em 2009, tornou-se obrigatório o uso do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), uma ferramenta que auxilia os processos de adoção no país. Essa obrigatoriedade extinguiu a adoção consensual – ou seja, quando a família biológica entregava o bebê para uma família disposta a adotar a criança.
Com o CNA, tanto as crianças quanto as famílias devem passar por um cadastro até que se tornem aptas para o processo de adoção. Hoje em dia, no Brasil, existem mais de 8 mil crianças cadastradas – e, portanto, aptas a serem adotadas -, mas o número total de crianças em abrigos chega a 41 mil. Paralelo à isso, existem cerca de 47 mil famílias cadastrados para adoção.
Essa diferença se dá porque, hoje, tenta-se o máximo possível a reinserção da criança em sua família biológica. Em entrevista, M.B.A., que trabalhou como diretora na Casa Lar de Itabirito por 11 anos, afirma que a maioria das famílias cujas crianças são retiradas está apenas passando por um momento de fragilidade. “É família. Normal. Gente, mas que está passando por um momento de dificuldade, e que a justiça entendeu que essa criança deve ser afastada até que esse problema da família seja resolvido.”
Números sobre a adoção no Brasil
No cadastro das famílias no CNA, é possível determinar uma série de preferências com relação às crianças a serem adotadas. Com esses números, é possível observar uma grande tendência a um perfil específico: menina, branca ou parda, sem deficiência. De número total de pretendentes, cerca de 38 mil aceitam crianças brancas, enquanto apenas 21 mil aceitam crianças negras (dados do CNJ de novembro de 2017).
Numa enquete online anônima com 260 entrevistados, a grande maioria dos participantes afirma que isso é uma conseqüência do racismo:
“Casais apropriados para adoção atualmente no Brasil são classe média/alta, ou seja, em sua maioria brancos devido a desigualdade social existente.”
“Acredito que a sociedade desde sempre carrega o racismo, isto é, mesmo que muitos não se considerem racistas de uma forma ou de outra esse preconceito aparece e isso conseqüentemente faz diferença na hora da adoção.”
Uma grande parte dos entrevistados também citou o medo do preconceito que essa criança virá a sofrer:
“Muitas vezes por causa de um preconceito que talvez nem elas mesmas sabem que têm. Às vezes por não saber lidar com o racismo que a criança sofrerá na sociedade. Às vezes por puro racismo, que existe muito no país.”
“Acredito que por causa do preconceito da sociedade, os próprios pais adotivos podem ser preconceituosos, sobre as vezes lidar com críticas (contra eles, a criança ou até mesmo ambos) também, etc.”
O casal global Bruno Gagliasso e Giovanna Ewbankc
por exemplo, adotou, em meados de 2017, sua filha
Chissomo (apelidada Titi),em uma de suas viagens a
Malawi. A família esbanja felicidade nas redes sociais,
mas ainda assim tiveram que se envolver em diversos
processos contra o racismo sofrido pela filha.
Mas será que isso realmente deveria ter tanto peso na escolha?
Gil Costa, de 16 anos, negro, foi adotado por uma família branca quando tinha apenas três meses de idade. Em entrevista, ele conta o quanto a adoção lhe trouxe benefícios. “eu tenho cinco irmãos, eu seria o sexto [...] era uma condição de vida muito precária. Acho que essa noção só me trouxe benefícios, porque a minha vida toda eu tive tanto amor e carinho e tudo que eu precisava tava na minha mão. E eu fico muito feliz por isso, porque eu não teria nenhuma dessas oportunidades se eu tivesse na minha família biológica.”

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Mas... e as crianças que não conseguem ser adotadas?
Mais de 30 mil crianças não estão cadastradas para a adoção. Muitas delas não conseguirão entrar nele ou serem reinseridos na família antes dos 18, e, mesmo aqueles que consigam, estão longe de ser o perfil idealizado por pretendentes e não conseguirão um lar adotivo, assim como os adolescentes já cadastrados.
Depois dos 18, quando os abrigos não podem mais acolher esses adolescentes, surge a difícil missão de reinserir-se na sociedade, na maioria das vezes sem um apoio para tal.
Para M.B.A., essa tarefa é difícil. “Por ter trabalhado muitos anos nessa área [...] eu acho que é difícil. Porque as pessoas às vezes não vêm esse adolescente como um adolescente normal, que só passou a vida dele num outro ambiente, que não foi o familiar. [...] A sociedade tem uma dificuldade porque o vê como muito 'coitado', e aí as oportunidades são dadas meio que diferenciadas.”
E é aí que a marginalização ganha palco. Sem uma família para lhe servir de base, tendo que se virar sozinho e enfrentando os preconceitos que a sociedade possui, as garras do tráfico e da violência se tornam atraentes, às vezes até como a única opção.


Mesmo com a distinção de raça sendo grande, os números são ainda mais exorbitantes quando se trata de idade.
Enquanto mais de 80% dos casais desejam crianças de 1 ano, estas são menos de 4% das aptas a adoção. A maior parte delas tem cerca de 15 anos, quando a porcentagem de pretendentes é mínima. O gráfico cresce de forma completamente desproporcional.
Na enquete citada anteriormente, apenas 65% dos entrevistados disseram que adotariam uma criança com mais de 6 anos. Quando perguntados sobre adolescentes, esse número cai para menos de 35%.

E O QUE PODE SER FEITO?
Além de políticas que contenham a marginalização e diminuam o preconceito racial, o caminho mais possível é a conscientização dos pretendentes. Segundo M.B.A., “Isso vem mudando porque existe um trabalho de conscientização, onde a gente é conscientizado de que a criança precisa. Eu quero ser pai, então eu vou trabalhar a minha cabeça também pra que algumas etapas desse filho possam já ter sido passadas. Eu não vou trocar frauda, eu não vou dar o banho, mas eu vou levar pra escola, eu vou acompanhá-lo na escola, eu vou acompanhar a pré adolescência [...] E a partir do momento que começou-se a trabalhar, começa-se a mudar. Eu não me mudo porque eu não ouvi falar numa outra coisa. Eu quero um loirinho mas eu nunca ouvi falar num negrinho, sabe?”
Hoje, nos abrigos, também existe o apadrinhamento, para pessoas que não podem ou não se interessam em adotar, mas querem ajudar uma criança. Nessa política, o padrinho acompanha a criança, e pode levá-la pra casa em datas festivas ou feriados. Esse apoio pode ser importantíssimo para o crescimento da criança e para sua vida adulta.
O manual “Três vivas para a adoção”, idealizado pelo CNJ para
a formação de futuros pais e mães, é uma ferramenta para que
esse pretendente conscientize-se e pensem “fora da caixa”,
em diferentes formas de adoção.
